Cultura para poucos: o paradoxo da Lei Rouanet em um Brasil com fome e carências básicas

Enquanto milhões de brasileiros enfrentam o desemprego, a fome e vivem sem acesso a serviços essenciais como saneamento básico, moradia e educação, o governo federal distribuiu, apenas com a Lei Rouanet, mais de R$ 34 bilhões nos últimos dois anos. Em 2025, foram R$ 750 milhões destinados a projetos culturais — muitos deles de grandes produtores e empresas com amplo acesso a patrocinadores privados.

O contraste é gritante.

Com R$ 750 milhões, seria possível comprar mais de 15 milhões de cestas básicas, construir mais de 20 mil moradias populares, ou implantar mil creches completas, beneficiando diretamente milhares de crianças em situação de vulnerabilidade. Poderíamos ainda ampliar a rede de escolas técnicas, melhorar hospitais e levar água encanada a centenas de comunidades carentes.

É preciso reconhecer: a cultura tem seu valor. Mas qual cultura? Para quem? E com qual prioridade?

O que se vê, muitas vezes, é uma elite cultural concentrando os recursos — em detrimento de milhares de projetos menores, comunitários, periféricos, que continuam sem acesso aos mecanismos da Lei. Enquanto isso, o Brasil real, aquele das periferias, das zonas rurais e das cidades esquecidas, sobrevive sem arte… e sem dignidade.

A discussão não é contra a cultura, mas contra os desequilíbrios e os excessos. Em um país com 33 milhões de pessoas em insegurança alimentar grave e mais de 5,5 milhões sem acesso a banheiro ou água tratada, investir bilhões em camarotes, peças teatrais luxuosas e festivais para poucos soa como um deboche institucionalizado.

Não é apenas uma questão de orçamento: é de prioridade moral.

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